Você já parou pra pensar por que você é tão feliz com seu namorado mais suas amigas não conseguem engolir ele? Ou por que você sempre pensa se suas atitudes foram aprovadas pelo seu amor, porque de alguma maneira não quer magoar os sentimentos dele. Ora, por que será que antes você era tão natural e espontânea e agora, ainda que ele aceite quem você é, existe um sentimento de limitação e receio antes de qualquer risada descontrolada com seus amigos, em público?
Relacionamentos abusivos são silenciosos e em marcha lenta, mas se você não quiser abrir os olhos, será consumida (e controlada) numa velocidade sem precedentes.
Eu vivi um, e quero falar sobre isso.
Sou uma pessoa completamente sem limites. Sempre tomei atitudes por impulso, meu riso é alto, eu falo alto, eu brinco muito e faço amizade ainda mais fácil do que eu tomo liberdade pra conversar com as pessoas. Sempre confiei na pessoa que meus pais criaram, que é bem geniosa mas com coração bom, e que ama ser 8 ou 80 e ser livre pra expressar tudo isso de uma vez só. E então me apaixonei.
Isso já faz algum tempo, mas só há pouco eu descobri que fiz parte, sim, de um relacionamento abusivo. E, por ter demorado tanto tempo pra eu acordar, quero ser capaz de discutir sobre o assunto e deixar claro que, infelizmente, isso pode acontecer com todas nós.
Eu me apaixonei de forma descontrolada e quis viver isso assim. Fui consciente que estava entrando em um território desconhecido e engoli meu medo de quebrar a cara pra poder sentir o que eu sempre tinha visto nos filmes e que ainda não tinha rolado comigo.
Ele era incrível. Ele amava minhas risadas escandalosas porque meu riso o contagiava. Ele amava como eu era espontânea e acabava tirando ele daquele rótulo de 'sou um cara sério'. Ele amava como eu dançava nas festas e olhava só pra ele, porque ninguém mais me chamava a atenção. Ele amava como eu tinha meus amigos e fazia questão deles - e de suas esquisitices. Ele me amava. Mas o amor virou outra coisa...
Você já ouviu a expressão de que quando vemos alguém muito fofo queremos guardar a pessoa num potinho? Bem, foi o que ele quis fazer comigo, de forma tão brilhante que eu demorei muito tempo após o término pra sacar o que tava rolando naquele relacionamento.
Deixando bem claro que: relacionamento abusivo não é só coisa ruim não! Na verdade eles nos fazem bem e não deixam de nos ensinar coisas, de estarem ali por nós e gostarem da gente de verdade, ok?
São apenas outras atitudes silenciosas que nos mudam aos poucos sem que tenhamos consciência. É quando seu humor depende exclusivamente se você e ele estão bem ou não. É quando você deixa de sair com suas amigas pra mostrar pra ele que você se dedica SIM ao relacionamento, mesmo que ele não tenha usado nenhuma palavra te proibindo de sair sem ele. É quando você abre mão de coisas que você gostava antes mas que agora você não consegue aproveitar mais, com ele ou por ele. E o mais importante: ele não pediu por nada disso. Ele não verbalizou que aquilo era ruim ou que ele não queria você perto daquela sua amiga mais. Ele não disse. Ele apenas te olhou de lado. Ou concordou quando você brigou com sua amiga e disse 'talvez ela não seja tão confiável assim, né?'...
Ele não quis se expressar. Ele apenas te conduziu para essa conclusão.
Infelizmente eu só acordei quando já era tarde demais: já não estávamos juntos pra eu poder levantar a voz e falar 'vai com calma aí cara'. Ele já não faz parte da minha vida, mas isso me alertou para futuros relacionamentos.
Eu que vi isso acontecer com uma ou duas amigas, não tinha percebido quando aconteceu comigo mesma. Eu que sempre estava de plantão pra alertar minhas besties de que alguma coisa tava rolando de estranho com elas ou com o casal, não me alertei de tudo o que eu estava mudando e de todos que eu estava me afastando por ele.
Deixo um alerta para quem quiser: escute seus amigos e sua família. São eles quem vão estar ali quando seu relacionamento acabar, ou quando você estiver acabada. Se eles te alertarem, não precisa radicalizar e chutar o pau da barraca: só comece a observar e se policiar.
E pensando nesse tema, eu fiz uma produção na aula inspirada nisso. E inspirada na ex editora de Moda, Franca Sozzani, uma italiana porreta que comunicou muitos temas polêmicos através de seus editoriais e que revolucionou o mundo fashion com sua opinião forte e feminista.
Franca foi maravilhosa em tudo o que ela fez. Gostava de rebater as críticas das suas fotos dizendo que 'a revista (ela era editora-chefe da Vogue Itália) era toda em italiano e que as imagens eram sua ferramenta para se comunicar com o mundo'. E ela usou muito bem sua ferramenta de mestre: fez diversos editoriais polêmicos e que denunciavam coisas das quais ela ia contra, como a violência doméstica; ou o vício de intervenções estéticas que a sociedade estava se afundando; falou do vazamento de petróleo no Golfo do México; na ida em massa de celebridades para a rehab; dentre outros temas pelos quais só ela conseguiriam unir glamour e polêmica em trabalhos tão marcantes e inspiradores.
Franca Sozzani morreu em 2016 em consequência de um câncer que ela já vinha lutando contra há mais de um ano.
A atual direção da Vogue Itália está sob o comando de um brasileiro-italiano, Giovanni Bianco.